A equipe do Colorado é a primeira da história a reverter uma desvantagem de 3-1 duas vezes na mesma edição dos playoffs.
Divulgação/Twitter Denver Nuggets |
É normal nos depararmos com times que não são, nem de perto, os principais favoritos de uma competição conseguirem chegar longe nas disputas por título. Isso faz parte dos esportes de alto nível, e o basquete não fica de fora dessa.
Na temporada passada, o Portland Trail Blazers ter chegado às finais de conferência foi uma surpresa, eliminando pelo caminho times como Oklahoma City Thunder, que até então tinham Russell Westbrook e Paul George no elenco, e o próprio Denver Nuggets em sete jogos. Aquele time liderado por Damian Lillard surpreendeu todos, e não será o único porque novos "azarões" vão surgir todo ano. São as surpresas que movimentam os fãs e o próprio esporte.
O caso do Denver Nuggets é parecido com o de Portland, porém ganha destaques muito maiores pelo fato da equipe ressurgir das cinzas duas vezes consecutivas. A principal atração proporcionada pela equipe do Colorado é justamente essa escalada silenciosa, saindo direto do abismo para chegar num lugar muito mais calmo e tranquilo.
Seria injusto dizer que Utah Jazz e Los Angeles Clippers foram equipes que fraquejaram ao estarem confortáveis com suas vantagens de 3-1 e não dar créditos aos Nuggets. Se as duas equipes caíram de rendimento, é bem provável que o culpado seja o time de Denver, e diversos fatores contribuíram para que a franquia superar suas adversidades e se garantir na final da Conferência Oeste.
A dupla Nikola Jokic e Jamal Murray
Anteriormente na NBA, era notório a força de trios na liga, como o Chicago Bulls de Jordan, Pippen e Rodman até aquele Golden State Warriors de Curry, Thompson e Durant. Porém, na última temporada, as duplas de super estrelas começaram a pintar em várias equipes: LeBron James e Anthony Davis nos Lakers, Kawhi Leonard e Paul George nos Clippers, James Harden e Russell Westbrook nos Rockets, entre outras.
Uma dessas duplas é Nikola Jokic e Jamal Murray, que apesar de não ter o mesmo tamanho daquelas citadas acima, são dois jogadores fundamentais para os seus times e foram os líderes das duas viradas neste playoff.
Na primeira virada, contra o Utah Jazz, Jokic bateu de frente com um dos melhores defensores de toda a liga, Rudy Gobert, o que, de certa forma, conseguiu tirar parte de todo o seu repertório, mas não o impediu completamente de ter uma média de 26.2 pontos por jogo. O grande destaque mesmo foi Jamal Murray, cujas diversas partidas que fez 40 e 50 pontos fizeram os Nuggets ainda ter chances de conseguir vencer o jogo 7.
Se a dificuldade com o Utah Jazz fora bem alta, o Los Angeles Clippers seria um percalço maior ainda, pois estaria lidando com o favorito a vencer a NBA nesta temporada. Era o que a maioria pensava: os Clippers vão passar. E o pensamento foi esse até a vitória dos Nuggets no jogo 5, o qual deveria terminar a série, mas foi aí que ela começou de fato.
Quando todos acreditavam que Murray havia deixado a irregularidade para trás, a forte marcação de Patrick Beverly aflorou e o rendimento do jogador de Denver despencou. Jokic surgiu como um grande carregador de piano dessa equipe, não só pontuando, mas também contribuindo com muitos rebotes e assistências. Porém as vitórias só aconteceram quando Jamal Murray se equiparou às apresentações de Jokic. O armador teve uma média de 14.6 pontos por jogo nas derrotas, e nas vitórias foram 28.5. Com o dueto em sintonia, os Nuggets foram muito mais fortes.
O estilo de jogo
Mais complicado do que montar um elenco de um time da NBA é colocá-lo para funcionar corretamente. E o treinador Mike Malone vem cada vez mais querendo aperfeiçoar essa equipe desde sua chegada em 2015. A grande evolução aconteceu na última temporada, quando Denver foi o segundo melhor time da Conferência Oeste possuindo um dos melhores ataques da liga.
Nesta temporada 2019/20 da NBA, os Nuggets garantiram a terceira colocação no Oeste e ainda possuíram o sexto melhor ataque da liga.
O estilo de jogo aparenta ser simples, mas, ao prestar atenção mais atentamente, ele possui diversos pontos interessantes. O ataque é praticamente movido por Murray e Jokic, este faz o corta luz para Murray seguir em direção a cesta ou procurar um companheiro melhor posicionado. Também é comum Jokic fazer o bloqueio, mas aparecer no perímetro para arremessar, este é o famoso pick and pop. O grandão sérvio pode ser um grande garçom também, e seus passes podem ser crucias para infiltrações no garrafão ou arremessos de três pontos livres.
Por outro lado, a defesa não é o forte do time de Denver. A eficiência defensiva consegue ser mais uma montanha russa, com alguns jogos muito bons, mas outros bem abaixo, geralmente sendo carregado pelas pontuações de ataque.
A série contra o Jazz foi um exemplo dos problemas defensivos da equipe. Os Nuggets enfrentaram um Jazz que possuem jogadores rápidos e bem ativos no perímetro. Não é à toa que Donovan Mitchell conseguiu fazer 57 pontos num só jogo. A situação naquela série melhorou quando Denver conseguiu encaixar melhor a marcação, algo que reduziu em até 20 pontos o placar.
Sabendo da importância defensiva, o time já fora mais esperto contra a equipe californiana e deu valor à defesa desde o início. O lado bom do jogo defensivo contra os Clippers foram as disputas mais parelhas entre os jogadores. O estilo da equipe de Los Angeles, que prioriza mais o físico e as penetrações do garrafão, foram mais fáceis de defender do que as investidas rápidas que o Jazz realizara.
Os jogadores altos dos Nuggets foram importantes para fazer com que os Clippers recorressem ao perímetro, onde, justamente, não estava sendo o lugar ideal para o time pontuar, a bola caia muito pouco. Enquanto isso, o ataque da equipe de Denver não parava, com Murray e Jokic fazendo corta luzes e o sérvio municiando Gary Harris e Paul Millsap no perímetro, onde a porcentagem estava alta para eles. O ataque funcional cresceu muito nas principais horas, mas o destaque é a defesa, irregular durante a série mas presente nas horas certas.
Assumindo o status de azarão
O ego é uma coisa muito natural em todos os esportes americanos. Franquias multimilionárias são gerenciadas por executivos que levam uma vida acima do padrão. Os donos das equipes sempre vão querer o que é melhor para a sua equipe, mas quem vence a liga é apenas um. No caso do Denver Nuggets, apesar de ser o terceiro colocado da conferência inteira, nunca era cotado para poder chegar tão longe, no máximo uma semifinal de conferência, igual a da temporada passada.
A transformação em azarão não foi nada voluntária, apenas surgiu com as consequências dos jogos e a repercussão em cima dos resultados. Era favorito contra o Utah Jazz, porém, quando todos viram a série 3-1 e muitas outras séries em andamento para assistir, os Nuggets eram carta fora do baralho. A viradas surgiram não só com apresentações incríveis de seus jogadores, mas com uma disputa franca entre duas equipes parelhas e motivadas a vencer pelo time e pela comunidade.
Denver chega para uma disputa contra o Los Angeles Clippers onde era nem cogitado vencer, com até pessoas acreditando numa varrida por parte da equipe californiana.
Um dos condutores para esse time ser o mais frio e resiliente desses playoffs é o Head Coach Mike Malone. O treinador dos Nuggets foi o maior motivador desse elenco, surgindo até com uma ideia contrária: a desvantagem faz com que o time cresça, se imponha. Uma das coisas que ele mais pregou para os jogadores é "se divertir em quadra", o que pode até parecer despreparo ou até presunção, mas era apenas a motivação cotidiana que o elenco precisava.
Ao se colocar numa posição inferior, o Denver Nuggets consegue deixar a pressão de precisar vencer para lá, colocando ainda mais em cima dos Clippers. O que foi visto no jogo desta terça (15) foi apenas dois opostos tentando convergir o mesmo objetivo de formas diferentes, sendo uma muito perspicaz e mais simbólica - e eficiente - do que a outra.
É difícil prever que a estratégia, ou uma outra virada, funcione contra o Los Angeles Lakers, mas é provável que a conversa no vestiário seja a mesma, e que o time vai lutar sempre.
Comentários
Postar um comentário