O anúncio da nova liga gerou uma comoção grande entre torcedores, jogadores e ex-jogadores, mas poucos entenderam como a situação chegou nesse ponto.
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Quando pensamos num domingo, já visualizamos um estádio, 11 jogadores de cada lado, uma bola e por aí vai. Domingo é dia de futebol. Mas o que marcou mesmo este último (18) foi a decisão das equipes poderosas do futebol em criar a iniciativa da Superliga Europeia. A competição, que será criada pelas próprias instituições, vai mexer com todas as estruturas do futebol, por justamente ser independente e fugir da alçada da UEFA e da FIFA.
Depois do anúncio surgiu uma grande comoção de torcedores, jornalistas e até mesmo jogadores e demais profissionais da área contra a ideia da Superliga. Contudo, antes de colocar a sentença de culpado para as equipes e profissionais envolvidos, é necessário entender o contexto dessa possível "revolução" do futebol e tirar as possíveis conclusões - e para isso que esta matéria se propõe. Até porque não existem bons moços na história, apenas um emaranhado de confusões e interesses que finalmente está estourando para o público. O assunto principal, definitivamente, é o dinheiro, mas principalmente em como adquiri-lo ainda mais e, também, em questionar a fórmula atual.
A disputa entre clubes e UEFA
Não é de hoje que o dinheiro é uma das grandes motivações de brigas entre o ser humano. Possivelmente, sempre foi e sempre será. Nesse caso específico, a necessidade de ganhar mais dinheiro fica por conta do que a pandemia causou no balanço dos cofres, aumentando ainda mais as dívidas e trazendo dificuldades para gerir uma instituição. O Real Madrid, por exemplo, que conta com o presidente Florentino Pérez, o líder dessa iniciativa da Superliga, não conta com acionistas injetando dinheiro - diferente de muitas outras equipes -, e, também, está construindo seu novo estádio; algo que aumenta as dificuldades de se manter bem financeiramente.
Com essa necessidade maior de ganhar dinheiro, a UEFA surge como uma vilã, pois uma competição como a Champions League, que gera grandes lucros para a entidade, não retorna completamente aos clubes. Na última temporada, o balanço comercial da competição mostrou que o arrecadamento foi de 3.25 bilhões de euros, sendo 1.95 bilhões destinado aos clubes, dividido entre participação, performance, coeficiente do ranking da UEFA e cotas de marketing televisivo. Essa diferença ocorre por conta dos gastos por trás da UEFA Europa League, pagamentos solidários e custos administrativos.
Apesar do ciclo da temporada 2019/20 ter sido o mais lucrativo da história, as equipes não se sentem satisfeitas com o controle da UEFA e questionam os negócios. Com o fato de as ligas nacionais terem se transformado em independentes e, muitas delas, serem bastante rentáveis, anima a possibilidade das equipes poderosas em criar uma liga própria e independente também. Até porque as ligas nacionais, por mais rentáveis que estejam sendo, não são suficientes para cobrir o balanço multimilionário de algumas equipes, algumas precisam chegar na Champions League para se sustentar; mas está cada vez mais difícil chegar lá.
A competitividade atrapalha a grandeza
Uma das grandes façanhas do futebol moderno foi justamente promover a união entre equipes e estabelecer uma liga com distribuição monetária igualitária. Um dos melhores exemplos disso é a Premier League, que foi uma das pioneiras desse novo modelo de negócios. Na temporada 2018/19, por exemplo, quem ganhou mais dinheiro foi o Liverpool, com 152 milhões de libras, enquanto o último, o Huddersfield Town, acabou com 97 milhões.
Através disso, foi possível notar que muitas equipes pequenas, movidas principalmente por um grande trabalho de gestão, começaram a competir mais nesse cenário e tirar o espaço de grandes equipes. Na Itália, o Napoli e a Roma tiraram os espaços de Inter e Milan, que estavam em crise, por anos, e ainda ambos viram a Atalanta despontar no país também; chegando até numa quartas de final de UCL. Na Inglaterra, a situação se complica para o famoso Big Six, que só pode classificar quatro para a Liga dos Campeões e sempre com a possibilidade de ficar muitos de fora, como está acontecendo atualmente, com Leicester City e West Ham United dentro do G4.
Na proposta da Superliga Europeia, essas equipes grandes não ficariam de fora, chamadas de "clubes fundadores". Dentro desse pacote, pode-se ver equipes como Milan, que não disputa Champions League desde 2014, e o Arsenal, que ocupa a 9ª colocação na liga inglesa. As motivações por trás de manter todas as equipes grandes na competição envolvem o marketing, pois um Real Madrid fora da competição significa menos audiência e consumo do produto; além de satisfazer os desejos dos clubes mais ricos. Contudo, esse sistema de negócios esportivos tem influência de vários cases de sucesso na américa, mais precisamente na América do Norte.
A fórmula norte-americana dos esportes
Mesmo que a cultura dos esportes americanos, como futebol americano, beisebol, basquete e hóquei, seja bem diferente da cultura que existe no futebol, o grande sucesso é algo que sempre chamará atenção. A maior liga do mundo, há tempos, é a NFL, seguida pela MLB e a NBA, e só depois delas que aparece a Premier League, na quarta colocação. Definitivamente, o fato de um esporte extremamente nacional e próprio da cultura americana ter crescido tanto dentro e fora do país é especial.
Apesar de não ser uma cópia idêntica, a ideia da Superliga Europeia tem a intenção de ranquear os times, através de jogos diretos - nem sempre com todos -, colocá-los para disputar as fases finais e, principalmente, excluir a possibilidade de as equipes mais importantes não disputarem a competição. Essa ideia também é parecida com o novo formato da Champions League, que foi apresentada pela UEFA e estreará apenas na temporada 2024/25. Com esse formato, o foco da Superliga seria valorizar as cotas de televisão, assim como acontece na NFL, onde a principal fonte de renda é do marketing, com destaque para o Super Bowl e seus comerciais grandiosos.
Porém, uma das diferenças mais gritantes das ligas americanas para a futura Superliga Europeia são os times. Na NBA, por exemplo, os 30 times da liga não são todos fortes, às vezes tem times que se classificam para as fases finais e não tem a mínima chance de vencer; na Superliga, todos seriam capazes. Mas a futura competição acredita no modelo e não nas diferenças, até por isso o banco estadunidense JPMorgan está financiando essa empreitada das equipes europeias, com direito a um pagamento de 3.5 bilhões de euros para cada equipe envolvida. A partir de todo esse contexto e da insistência das equipes em querer a competição, o futebol pode estar se encaminhando para uma nova era.
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