[opinião] O atual modelo da competição privilegia as equipes mais fortes e expõe a fragilidade de todo o continente no cenário econômico.
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Divulgação/Twitter/LibertadoresBR |
Pela segunda vez consecutiva, a final da Libertadores será composta por duas equipes brasileiras. Anteriormente, esse fato seria algo completamente fora do normal e especial para o nosso país. Entretanto, atualmente, trata-se do resultado de um desequilíbrio dentro do continente, o qual pode afetar não só os times mais pobres da América do Sul, como também os mais fortes e o torneio como um todo. Certamente, os brasileiros estarem cada vez mais forte no cenário internacional é ótimo e significa uma evolução, mas está sendo de forma desregulada. Ou seja, só Argentina e Brasil crescem.
Não é de hoje que os clubes desses dois países estão dominando a competição. Apesar dessa edição não ter contado com nenhum clube argentino nas semifinais, os últimos anos tiveram argentinos e brasileiros em números muito altos. No ano passado, Palmeiras x River Plate de um lado e Boca Juniors e Santos do outro. Em 2019 e 2018, dos quatro times nas semifinais, eram dois brasileiros e argentinos. Numa contagem geral, desde 2015, foram 18 aparições de clubes argentinos ou brasileiros dentro das semifinais da competição. River Plate, cinco vezes, e Boca Juniors, quatro, são os que mais apareceram.
Portanto, não se trata mais de casos esporádicos ou coincidência do destino. Essa é a realidade do futebol sul-americano. Muitos podem dizer - e com razão - que se trata da força dos dois países no continente. Decerto, Argentina e Brasil dominam a América do Sul, seja em futebol de seleções ou de clubes. No entanto, essa superioridade está aumentando, consideravelmente, nos últimos anos. Afinal, entre 2012-16, apenas 50% das semifinais foram compostas por times brasileiros e argentinos. Entre 2017-21, esse número subiu para 90%, com 100% em finais.
Final da Libertadores 2018 entre Boca e River - Foto: Reprodução/AFP |
A grande explicação dessa superioridade está nas mudanças que o torneio sofreu nos últimos anos. Como muitos se recordam, a Libertadores teve equipes mexicanas até 2015, as quais disputavam tanto o torneio da CONCACAF quanto o da CONMEBOL. As maneiras de se classificar para a competição foram alteradas com as saídas dos times mexicanos, e os brasileiros e argentinos se beneficiaram com isso. Além disso, o torneio aumentou de 38 cubes para 47, o que aumentou ainda mais o número de vagas. Dessa forma, o famoso G4 do Brasileirão se transformou em G6, com a possibilidade de aumentar de acordo com os campeões da temporada.
Essa necessidade de repaginar a Libertadores entrou com a proposta de tornar a competição em um produto mais vendável. Em outras palavras, internacionaliza-lo. De certa forma, isso é ótimo, porque é uma maneira de você melhorar o futebol e ganhar em cima disso. Portanto, para chamar mais a atenção do público internacional, os clubes argentinos e brasileiros, que possuem maior apelo internacional, receberam o maior número de vagas, apesar de todos os países, também, terem aumentado.
No entanto, essa fórmula está cada vez mais deixando a competição previsível e pouco equilibrada. Os principais times passam da fase de grupos com extrema facilidade e só conseguem serem desafiados quando enfrentam algum time de mesmo nível. Nesta edição, tivemos o Barcelona na semifinal, que passou por Velez e Fluminense no mata-mata, duas equipes que não estão entre os principais clubes de Argentina e Brasil. Quando o time equatoriano enfrentou o Flamengo, perdeu os dois jogos e não marcou nenhum gol.
Se permanecer nessa fórmula, a competição dificilmente se sustentará pela sua competição, mas, sim, por conta de ser valorizada no continente. A CONMEBOL precisa se preocupar não só com a valorização do produto - que está sendo bem-feita: identidade própria, estar presente no jogo FIFA, venda de direitos para o exterior -, mas também com o equilíbrio. Portanto, por mais que as equipes mais fortes possam ser muito importantes e a quantidade de títulos para alguns times possa aumentar, os elos mais fracos precisam ser levados em consideração quando pensamos numa competição.
Libertadores dentro do jogo FIFA - Foto: Divulgação/EA Sports |
Afinal, o equilíbrio é algo que é levado extremamente em consideração quando pensamos nos campeonatos europeus. Além disso, a Champions League também é lembrada pela sua dificuldade de prever um campeão, apesar da Inglaterra estar crescendo muito no cenário europeu. Mas, no geral, uma Libertadores aberta e competitiva se torna ainda mais atrativa e empolga muito mais os torcedores. Como resultado, melhora outros torneios importantíssimos, como o Brasileirão e a Copa Sul-Americana - que está sendo dominada por argentinos e brasileiros também.
Na próxima temporada, poderemos ter nove times brasileiros entrando na Libertadores, e mais seis argentinos. Com a desigualdade no continente, não seria nenhuma loucura pensar que o mata-mata possa ser dominado por argentinos e brasileiros, ou somente pelas equipes tupiniquins. Afinal, quase aconteceu uma semifinal 100% brasileira nesse ano, caso o Fluminense tivesse derrotado. Dessa forma, se essa estrutura desigual permanecer, a qualidade da Libertadores estará em jogo, assim como a sua importância no cenário local e internacional.
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