A melhor temporada da liga francesa dos últimos anos

A disputa pelo título da Ligue 1 desta temporada mostra uma competitividade de dar inveja, mas que não deveria ser surpreendente.

Liga francesa vem trazendo competição entre vários times
Reprodução/Site oficial da Ligue 1 Uber Eats

Apesar da paixão pelo clube do coração ser um fator fundamental no futebol, a competitividade é algo que também agrega muito valor à competições e à ligas pelo mundo todo. A Champions League, principal competição de clubes do mundo, tem uma importância gigante por justamente confrontar as melhores equipes, num torneio competitivo e imprevisível. Outro exemplo de fácil identificação é o Brasileirão, onde a grande disputa pelo título promove uma emoção ainda maior perto do fim.

Na Europa, o título de liga mais competitiva era, sem dúvidas, da Premier League, mas a disparada do Manchester City nos últimos meses inviabilizou qualquer competição na Inglaterra. Com isso, abriram-se os olhos para uma liga que raramente mostrava níveis de competitividade: a liga francesa. Dominada pelo Paris Saint-Germain desde 2012/13 - com exceção do título do Mônaco em 2016/17, a Ligue 1 nunca foi resumida em competitividade, muito pelo contrário, a desigualdade de nível técnico e investimento entre PSG e os demais era assustadora.

Contudo, esta temporada 2020/21 vem se mostrando totalmente diferente do habitual. Atualmente se encaminhando para a 32ª rodada, o líder do campeonato é o Lille, com 66 pontos, seguido de PSG, Mônaco e Lyon, com 63, 62 e 61, respectivamente. A diferença de cinco pontos do primeiro para o quarto mostra como a liga ainda está em aberto na sua reta final, e a estranheza que isso causa é totalmente natural. Mas não se trata de uma surpresa, pois o cenário francês de futebol vem se alterando e imprevistos surgiram.

A temporada instável do PSG

Totalmente acostumado a vencer a Ligue 1, pode até parecer que o time de Paris não se importa com a competição, mas, na real, sente a obrigação de levantar a taça sempre. Não apenas para fazer jus aos investimentos de tantos anos ou a superioridade técnica, mas também para se igualar ao Saint-Étienne, detentor de dez títulos dos pontos corridos, logo nesta temporada. Mas esse destino tão óbvio pode ser adiado para a próxima temporada, devido às mudanças desta temporada, que pareceram mexer com a equipe.

Logo no dia de Natal, a demissão de Thomas Tuchel fora anunciada, e logo as especulações - que viriam a estar corretas - sobre a chegada de Mauricio Pochettino, ex-técnico do Tottenham, aqueceriam o gelado dezembro em Paris. Mesmo que Tuchel tenha feito a melhor campanha da história da equipe em Champions League, não foi suficiente para que as antigas suspeitas sobre o alemão e supostas desavenças com o elenco voltassem à tona. Afinal, técnico é algo bastante polêmico na equipe francesa, desde a passagem de Carlo Ancelotti até a única temporada de Unai Emery, em 2017/18.

Mesmo com essa questão, Pochettino assumiu prontamente os parisienses e trouxe consigo a bagagem de Tottenham, onde não venceu nenhum título, mas que lhe garantiu respeito e reconhecimento. Porém, trata-se de um novo trabalho, e com isso também chega dificuldades pelo caminho, algo que atrapalha qualquer tentativa de sequência. Além disso, lesões de jogadores fundamentais, como Neymar e Verratti, atrapalham ainda mais e justificam um desempenho abaixo do esperado. Só na Ligue 1 foram oito derrotas, número que não se repetia desde 2010/11, quando a equipe terminou as 38 rodadas em 4º.

O surgimento de coadjuvantes

Além de equipes fortes que sempre brigam por títulos, é necessário coadjuvantes, ou seja, clubes menores, porém competitivos, para que uma liga possa ser acirrada e chamar atenção das pessoas. Na Espanha, por um bom tempo, Real Madrid, Barcelona e Atlético de Madrid eram as potencias da liga, mas a disparidade com as demais equipes transformava a competição em menos competitiva. Na Inglaterra, existe o Big Six e muitos outros coadjuvantes que deixam a competição interessante. Com essa estrutura, na França, não havia nem equipes fortes, nem coadjuvantes de peso. Até essa temporada.

Pelo nível econômico, não dá para colocar o Lille numa posição muito elevada no futebol francês, mas o time já vem demonstrando força nos últimos anos e consolidou de vez nesta temporada. O líder do campeonato pode não ter o financeiro do PSG, porém vem tentando chegar lá, pois só nas últimas três temporadas, através de vendas de jogadores, adquiriu 318.300.000 milhões de euros. Além disso, os investimentos das últimas temporadas, como Jonathan David, Renato Sanches e Yusuf Yazici, caíram como uma luva, e junto com a longevidade do treinador Christophe Galtier no comando, elevaram o clube de patamar.

Outra equipe que vem surpreendendo nesta temporada é o Mônaco, e, de fato, trata-se de uma surpresa grande pelas últimas temporadas. Após o sucesso de Mbappé e daquele time que chegou à semifinal da Liga dos Campeões, o Mônaco fez investimentos ruins e não conseguiu implementar um trabalho de sucesso desde então. Até que nesta temporada chegou o ex-treinador do Bayern de Munique, Nico Kovac, que vem comandando a equipe com uma média de pontos por jogo de 2.09, e o segundo melhor ataque da competição, com 64 gols marcados. 

Por último, e não menos importante, o Lyon. Uma das maiores surpresas da temporada passada foi a chegada da equipe francesa na semifinal da Champions League, mas não foi um caso isolado. O Lyon vem se reestruturando nos últimos anos e colocando um balanço positivo desde 2017. Um ponto significativo nessa campanha positiva recente foi a chegada do treinador Rudi Garcia, que chegou antes da fase final de Liga dos Campeões e vem comandando uma equipe que está ganhando mais experiência e peças cada vez melhores em todos os setores.

A evolução do futebol francês

Mesmo se tratando do atual campeão do mundo, historicamente, a França não é um berço do futebol. Pegando exemplos de países mais aficionado, como Brasil e Inglaterra, uma das atividades turísticas é conhecer algum estádio e assistir uma partida de futebol; diferente da França, onde o futebol, nem de perto, se compara com outros pontos turísticos da cidade. Um dos reflexos desse desinteresse atinge a própria liga nacional, que acaba perdendo ganhos com cotas de televisão, deixando muitos assentos vazios nos estádios e sendo pouco comentada.

Contudo, o sucesso da Seleção Francesa abre os olhos para as possibilidades de darem mais valor para a Ligue 1. Até porque os jogadores que foram campeões, por mais que muitos não fossem nascidos na França, eles jogaram ou tiveram seus conhecimentos futebolísticos aprimorados por lá. Mas a maioria dos jogadores, formados em times pequenos ou não, saem cedo do país ou não são aproveitados pelas equipes maiores. Casos como o de Kingsley Coman e Paul Pogba, que pouco foram aproveitados pelos times franceses, independentemente da posição, se repetem aos montes com muitos jogadores.

Com a necessidade de não deixar isso acontecer, muitas equipes começaram a se importar em cuidar dos seus talentos, ou pelo menos usá-lo com frequência até vender por um bom dinheiro. A manutenção dos jogadores Mbappé e Kimpembe, do PSG, é fundamental nesse processo de valorizar ainda mais a liga nacional e, consequentemente, atribuir força à Ligue 1. Não apenas em questão cultural, de manter os franceses na França, mas também pela questão econômica, de manter grandes jogadores para melhorar a imagem da competição e, nas possíveis transferências, tirar quantias incríveis.

Mesmo que seja a passos curtos, o futebol de clubes da França vem se tornando mais consciente da sua posição na Europa e tenta encontrar meios de se tornar mais relevante. Seja através de investimentos recheados, de vendas de jogadores ou de trabalhos bem cuidados, o caminho para a Ligue 1 continuar evoluindo, assim como o futebol de seleções da França, está traçado. Com as decisões certas e boas gestões, a Ligue 1 pode buscar o espaço entre as melhores ligas da Europa futuramente.

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