Por que uma competição tão importante para todo mundo pode ser tão pouco lembrada pelos europeus? Qual o nível de importância da competição para eles?
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Foto: Divulgação/Twitter/Chelsea FC |
Primeiramente, sempre é fácil cair no papo de que os europeus são muito melhores que o restante do mundo e por isso não ligam. Por mais que seja absolutamente verdade, os europeus serem muito melhores não é o único motivo plausível para o torneio ter uma relevância pequena para eles. No entanto, o Mundial de Clubes ainda segue firme, todos anos. Passou da fase Intercontinental de Clubes para um torneio organizado pela FIFA.
Antigamente, ninguém ligava
Antes de mais nada, para justificar o subtítulo meio apelativo, os times ligavam, sim, para a competição. No entanto, ela tinha uma importância extremamente pequena. Se hoje as equipes europeias já não levam a competição com tanta seriedade, antigamente era ainda pior. Um dos célebres casos aconteceu em 1974, quando o Bayern de Munique, atual campeão da Champions League, simplesmente se recusou a jogar o torneio. Dessa forma, o Atlético de Madrid, o vice-campeão, tomou a vaga e venceu a Copa Intercontinental encima do Independente.
Para contextualizar melhor o torneio, vale uma interrupção para comentar sobre o Brasil. A competição tinha uma certa importância, mas não se comparava aos estaduais e aos campeonatos nacionais. Antigamente, nem a Libertadores era assim tão impactante. O Santos de Pelé, que ganhou Libertadores e Mundial em dois anos seguidos, 1962/63, não venceu porque realmente lutou para isso, mas, sim, porque era muito bom e vencia tudo que aparecia. Outro caso que mudou tudo foram as conquistas do São Paulo, em 1992/93, que aumentou a rivalidade dentro do estado e, também, os patamares de títulos dentro do Brasil.
Um dos alvos mais comuns dessa perseguição de Mundial de Clubes é o Palmeiras, porque a equipe, diferente dos rivais de estado, não possui esse título nos moldes atuais, apenas a Copa Rio de 1951. Como foi dito, a Libertadores não tinha importância também, até que os demais times brasileiros começaram a ganhar, levando uma pressão maior para os demais. Em entrevista, o ex-goleiro Marcos, do Verdão, já comentou que esse título era pouco lembrado antigamente, só ganhou força depois da conquista corintiana, em 2012. Assim como, o Timão, que foi bastante zoado por não ter Libertadores, até 2012 acontecer.
A entrada da FIFA salvou o torneio
Voltando para a Europa, vale destacar que, antigamente, a Copa Intercontinental era entre o campeão da Champions League e o da Libertadores. Pois, nos primórdios do torneio, em 1960, ele era organizado pela UEFA e pela CONMEBOL, que, obviamente, além de serem as duas maiores entidades do mundo, privilegiavam os seus continentes. Futuramente, em 1980, a competição começou a ser gerenciada pela Associação de Futebol do Japão, que passou a colocar os jogos no Japão, algo que se transformou em tradição.
No entanto, com o passar dos anos, o óbvio aconteceu: os times europeus começaram a evoluir consideravelmente, principalmente após a Lei Bosman, em 1995, que tirou a barreira de estrangeiros nas ligas europeias, abrindo espaço para que as equipes pudessem rechear os seus elencos com estrangeiros. De lá para cá, todos os títulos de Champions League foram conquistado por ingleses, italianos, espanhóis, franceses ou alemães, com exceção do Porto, de José Mourinho, em 2004.
Portanto, a diferença dos duelos individuais ficou ainda mais evidentes, enfraquecendo o torneio e diminuindo o interesse. Se pegarmos as últimas disputas da Copa Intercontinental, já nos anos 2000, podemos ver dois títulos sul-americanos. Mas, nesse contexto, o interesse europeu já estava mínimo.
Mas a FIFA, no ano 2000, tentou criar o seu próprio Mundial, num torneio ainda confuso, que ganhou consistência a partir de 2005. Na verdade, a intervenção da entidade máxima do futebol deu vida à competição. Não só aumentou o número de envolvidos, mas também mudou de nome, que no inglês é: "Copa do Mundo de Clubes da FIFA". Além disso, uma competição organizada pela FIFA transforma o torneio, agregando mais valor e importância para ambos os lados. Aqui no Brasil, foi a consolidação de fato, principalmente com os títulos dos brasileiros São Paulo (2005) e Internacional (2006).
Na Europa, por mais que ainda diminuíssem a importância, essa glamourização abriu os olhos dos torcedores europeus. A bela taça, o patch de campeão e a ida a outro continente para um torneio da FIFA deram ânimo para os times mais poderosos do mundo. Porém, não foi a única salvação, porque aí entra outro problema grande por lá.
Reprodução/Getty Images |
A quebra do calendário
Certamente, não importa onde, o calendário das equipes é sempre um problema. Na Europa, não é diferente. Apesar de ser organizado e planejado com muita antecedência, é uma organização caótica, principalmente para as equipes da Inglaterra, que são um dos primeiros a começar a temporada e não descansam na época de festas, com o tradicional Boxing Day e os jogos logo nos primeiros dias do ano. Além disso, possuem duas longas copas nacionais, e caso algumas equipes forem longe nas duas, são muito mais datas.
Mas, quando pensamos em calendários, tirando a questão de lesões, outra preocupação é o ritmo, o ápice e o embalo na temporada. Para conquistar tudo isso, o ideal é a consistência, com partidas contra times conhecidos para poder colocar o seu estilo em prática e aperfeiçoa-lo. Porém, se a equipe disputar o Mundial de Clubes, tudo isso para por uma ou uma semana e meia para a disputa da competição, o que pode atrapalhar qualquer tentativa de manter o elenco constante. Além disso, tem a viagem, as lesões no elenco e a possibilidade de mais outras contusões acontecerem.
Vale ressaltar que, apesar do torneio acontecer há décadas, ele não é tradicional. O Mundial de Clubes da FIFA, o qual os times europeus mais se preocupam, está apenas desde 2005, o que é impossível de criar uma tradição muito grande. Ou seja, esse é mais um elemento que coloca uma barreira entre o torneio e os europeus.
Atualmente, como eles enxergam a competição?
Primeiramente, a dominância de Barcelona e Real Madrid nos últimos tempos deu uma escondida na competição para alguns times, gerando mais interesse quando acabou a hegemonia recente dos merengues. Mas, nos últimos anos, com Liverpool e Bayern, foi possível notar um certo desinteresse. No caso dos Reds, o que salvou foi a presença de muitos brasileiros no elenco, algo que Klopp disse, em entrevista, que utilizou a empolgação deles para o restante dos atletas. E o time da Bavária, conhecido pelo ataque bem prolifico, fez dois gols no Al-Ahly e apenas um, no Tigres.
Fazendo uma análise fria do Mundial de Clubes, tecnicamente falando, é basicamente uma Supercopa, com os campeões de todo pedaço do mundo. Porém, assim como na nossa sociedade, todos sabem que os europeus (pode colocar os estadunidenses nessa conversa também) se sentem mais superiores e tendem a colocar a cultura deles em primeiro plano. Tudo bem valorizar o que é seu, mas eles também diminuem a capacidade de outros continentes. Por isso, o interesse é menor na competição até hoje. Pois, a distância técnica e tática não é tão distante assim quanto muitos pensam. Basta pegar o sufoco que o Flamengo deu no Liverpool ou até mesmo o Tigres no Bayern.
Divulgação/Twitter/FIFA |
Mas, no nível de Supercopa, o Mundial de Clubes é uma confirmação da Champions League. Assim como eles buscam ganhar a Supercopa do país e da Europa, eles querem a do mundo também. Além disso, como foi dito acima: a glamourização deu novos ares para o torneio. Os torcedores querem comprar a camisa com o patch e fecharem o ciclo de títulos, como Bayern conseguiu em 2020: Champions League, Bundesliga, Copa da Alemanha e suas respectivas Supercopas, incluindo o Mundial.
No entanto, é bom lembrar: o fato de eles levarem a competição menos a sério não diminui o desempenho de algumas outras equipes. Ou até mesmo, se eles perderem, como pode acontecer com o Chelsea neste sábado, falar que eles não se importam não é argumento para menosprezar título, porque ninguém gosta de perder título, até mesmo de Florida Cup.
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